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Meio Ambiente

Microplásticos: poluição toma conta dos rios e igarapés em Manaus

O plástico demora mais de 400 anos para se decompor e suas micropartículas já são encontradas dentro de peixes no Amazonas

Microplástico próximo de igarapé em Manaus. Foto: Ana Kelly Franco
Microplástico próximo de igarapé em Manaus. Foto: Celso Maia

Manaus (AM) – Para onde olharmos em Manaus, vemos sinais do consumo de plásticos, seja em garrafas de água, utensílios domésticos como frascos de shampoo, blusas sintéticas, cabides, embalagens, sacolas entre várias outra formas. É possível também ver a quantidade desses plásticos nos igarapés, que ficam evidenciados tanto na seca, quanto na cheia.

Essa poluição plástica também afeta os rios em Manaus e no Amazonas de uma forma que não aparece em olho nu, de acordo com uma pesquisa da Dra. Andrea Waichman ecotoxicologista uma das autoras do artigo Large-scale monitoring and risk assessment of microplastics in the Amazon River  que revelou a presença de microplásticos no rio Amazonas e locais próximos de Manaus.

Essas amostras de microplásticos foram semelhantes às relatadas em rios altamente contaminados, como o rio Yangtze na China.

Os microplásticos (MPs) são partículas menores que 5 milímetro e podem ser encontrados em diversas formas, como fibras, fragmentos e filmes.

Em entrevista para a Agência Jamaxi, a Dra. Andrea Waichman, explicou um dos tipos mais comuns de MPs encontrados na região foram as fibras de poliéster.

As fibras de poliéster, derivadas principalmente da degradação de têxteis sintéticos durante a lavagem, mas também provenientes de PETs e filmes plásticos, foram destacadas como a forma mais abundante de microplásticos”, destacou.

 

Dra. Andrea Waichman destacou que a “falta de instalações de tratamento de águas residuais na região amazônica e de disposição adequada de resíduos”, é a razão para a alta ocorrência dessas partículas.

Consumo, vazamento e reciclagem de resíduos plásticos

De acordo com o Panorama dos Resíduos Sólidos 2021, divulgado pela Abrelpe, Manaus é apontada como uma das 9 cidades responsáveis por 13% do vazamento de resíduos plásticos no Brasil.

A pesquisa evidencia que Manaus e São Paulo são considerados hotspots de poluição hídrica, devido ao volume de resíduos gerados. São mais de 10 mil toneladas de resíduos plásticos no ambiente somente na capital amazonense. 

O consumo do plástico é maior do que é reciclado, apontam pesquisas da WWF, Plastic Free Foudation e o Atlas da Reciclagem.

Reciclagem de plásticos em Manaus. Fotos: D’Castro / Semcom

As principais fontes de microplásticos em Manaus

Dra. Andrea Waichman explicou que as áreas urbanas densamente povoadas são particularmente suscetíveis à contaminação por microplásticos (MPs) devido às várias fontes de poluição produzidas pelo homem, que são:

  • Desgaste de Pneus: O desgaste de pneus de veículos durante a condução é uma das principais fontes de microplásticos urbanos. Partículas de borracha são liberadas e depositadas nas estradas, sendo posteriormente transportadas pelo vento ou pela água da chuva para ambientes aquáticos e solos.
  • Fragmentação de plásticos urbanos: Plásticos maiores, como sacolas, embalagens e outros resíduos plásticos, se fragmentam devido à exposição ao sol, ao calor e às intempéries, gerando microplásticos. Esses fragmentos podem ser levados pelo vento ou pela água da chuva para sistemas de drenagem e corpos d’água.
  • Efluentes de Estações de Tratamento de Esgoto (ETE): As estações de tratamento de esgoto urbanas podem ser fontes significativas de microplásticos. Embora muitos sistemas de tratamento removam uma parte dos MPs, uma quantidade significativa ainda pode ser liberada nos efluentes tratados, contaminando rios e igarapés.
  • Lavagem de Roupas Sintéticas: A lavagem de roupas feitas de fibras sintéticas (como poliéster, nylon e acrílico) libera microfibras plásticas que não são totalmente capturadas pelos sistemas de tratamento de água. Essas microfibras acabam entrando nos cursos de água através do efluente doméstico.
  • Resíduos de Construção e Demolição: Materiais de construção que contêm plásticos, como isolamento e tubulações, podem liberar microplásticos durante a construção de edifícios. Esses resíduos podem ser dispersos no ambiente urbano e nos sistemas de drenagem.
  • Produtos de Higiene e Cosméticos: Alguns produtos de higiene pessoal e cosméticos, como esfoliantes e cremes dentais, contêm microesferas plásticas que podem ser liberadas no esgoto doméstico e, eventualmente, atingir ambientes aquáticos.
  • Descarte Inadequado de Resíduos Plásticos: A gestão inadequada de resíduos sólidos urbanos, incluindo descarte ilegal e lixões não controlados, contribui significativamente para a dispersão de microplásticos no ambiente. O vento e a água da chuva podem transportar partículas plásticas desses locais para áreas mais amplas.
  • Poeira Urbana: A poeira urbana pode conter microplásticos provenientes de várias fontes, incluindo pneus, fragmentação de plásticos e partículas depositadas a partir da atmosfera. Essa poeira pode ser inalada ou depositada em superfícies e alimentos.
  • Sistemas de Drenagem e Águas Pluviais: Os sistemas de drenagem urbana coletam águas pluviais que podem transportar microplásticos das ruas e outras superfícies pavimentadas para corpos d’água próximos. Esses sistemas frequentemente carecem de tecnologias adequadas para filtrar partículas tão pequenas.
Microplásticos e lixos em igarapés em Manaus Foto: Celso Maia
Microplásticos e lixos em igarapés em Manaus Foto: Celso Maia

Falta de saneamento básico

A pesquisadora destaca que o estudo é um diagnóstico que evidencia um problema na nossa região. O artigo científico chama a atenção para a implementação de políticas adequadas de saneamento básico, seja de tratamento de esgoto como também de disposição adequada de resíduos sólidos.

“Esse problema está relacionado à falta de saneamento nas principais cidades da calha do Rio Amazonas. O acúmulo de microplasticos nas águas pode trazer transtornos para a biota aquática e para a população, principalmente por meio do consumo de peixes e outros organismos aquáticos com alto conteúdo de microplásticos.”, revela.

Microplásticos e lixos em igarapés em Manaus. Foto: Ana Kelly Franco
Pneu dentro de igarapé em Manaus. Foto: Celso Maia

A conscientização e educação da população sobre destino correto de plásticos é um dos pontos cruciais para evitar essa alta contaminação.

Os perigos dos microplásticos

Jaraqui, aruanã, tucunaré, tambaqui, sardinha e pacu são as seis espécies de peixes que foram encontradas microplásticos em seus tratos gastrointestinal.

É o que revelou a pesquisa ‘Ocorrências de microplásticos em peixes comercializados em Tefé’ coordenada pela mestra em zoologia Carolina Gomes Sarmento.

A pesquisa examinou 336 peixes, neles foram encontradas 34 partículas com forma de fragmentos e filamentos de sacolas, linha de pesca e isopor.

Microplásticos são onipresentes no ambiente devido à degradação de plásticos maiores. Eles podem entrar na cadeia alimentar aquática e terrestre.

Estes microplásticos podem acumular-se nos tecidos dos animais, tornando-se uma fonte direta de contaminação quando consumidos pelos humanos, num processo chamado bioacumulação.

Microplásticos podem contaminar alimentos durante o cultivo (por exemplo, no solo ou na água de irrigação), processamento (contato com superfícies plásticas) e embalagem (migração de partículas dos materiais de embalagem para os alimentos), além do consumo de animais com microplásticos.

Plático, isopor, restos de obras ao redor de igarapé em Manaus. Foto: Celso Maia
Plático, isopor, restos de obras ao redor de igarapé em Manaus. Foto: Celso Maia

Perigo dentro do organismo

Uma vez ingeridos, os microplásticos são translocados dentro do organismo. Após a ingestão, eles podem atravessar a barreira gastrointestinal.

Partículas de microplásticos variam em tamanho de 1 milímetro a 5 milímetro. Estudos indicam que partículas menores podem ser absorvidas pelas células intestinais, por meio de mecanismos como endocitose ou passivamente através de espaços paracelulares.

As partículas menores – maiores de 1000 nanômetros também chamadas de nanoplásticos – são mais propensas a atravessar as membranas biológicas devido ao seu tamanho reduzido.

“Uma vez atravessada a barreira intestinal, partículas de microplásticos podem entrar no sistema linfático e, posteriormente, na circulação sanguínea. Microplásticos na corrente sanguínea podem ser distribuídos para vários órgãos e tecidos do corpo, incluindo fígado, rins e cérebro”, explicou Dra. Andrea Waichman.

 

Durante a pesquisa, também foram coletados peixes, como piranhas, identificados com a presença de Micorplásticos (MPs) em seus órgãos, o que coloca em risco a vida aquática amazônica. Dr. Adriana menciona que a ingestão dos MPs como ocasionar vários danos ao organismo.

 

“A presença de microplásticos pode gerar espécies reativas de oxigênio, levando ao estresse oxidativo e dano celular. Os Microplásticos podem desencadear respostas inflamatórias, ativando macrófagos e outras células do sistema imunológico”, enfatizou.

Algumas evidências sugerem que microplásticos podem causar danos ao DNA, aumentando o risco de mutações genéticas.

Além disso, os microplásticos podem atuar como vetores de substâncias químicas tóxicas adsorvidas em suas superfícies ou liberadas dos próprios plásticos, como ftalatos e bisfenol A (BPA), dentre outras.

Microplásticos e lixos em igarapés em Manaus Foto: Celso Maia
Microplásticos e lixos em igarapés em Manaus Foto: Celso Maia

Ações para mitigar à contaminação por MPs nos ecossistemas amazônico

Dr. Adriana ressalta que a principal forma de mitigar é a partir de estruturas adequadas de saneamento básico, como tratamento de esgotos e disposição correta de resíduos sólidos.

A água distribuída pela concessionária, que passa por tratamento, deve estar livre de microplásticos, embora isso depende do tipo de tratamento realizado.

“A verificação de microplásticos seria recomendável”, explica.

Em entrevista para Agência Jamaxi, Semy Ferraz, gerente de Responsabilidade Social da Águas de Manaus, revelou que na capital amazonense não há sistema de detecção de microplásticos tanto na água quanto nas Estações de Tratamento de Esgoto.

Outra medida muito importante é a substituição de plásticos por outros produtos mais sustentáveis.

“Ainda vejo o uso de muito descartável, canudos, copos plásticos, sacolas plásticas em supermercados, embalagens plásticas. Precisamos sensibilizar as pessoas para os danos dos plásticos no ambiente no sentido de reduzir o uso e o descarte incorreto”, finalizou.

* Esta matéria jornalística é protegida pela Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que regula os direitos autorais no Brasil. A reprodução total ou parcial deste conteúdo, por qualquer meio, sem a devida autorização expressa do autor, é proibida e pode resultar em sanções civis e criminais. Todos os direitos reservados.

 

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